sexta-feira, 29 de agosto de 2008

SENILIDADE...COISA ESTRANHA !!!!!!

Aqui há muitos anos, tive o prazer de ter na minha casa, uma avó da minha esposa, que por ter ficado afastada dos seus 5 netos, estava a viver sozinha na sua casa, embora tivéssemos encontrado uma jovem que até podia ser filha dela, que a ela se dedicou, mas não podia estar as 24 horas de cada dia.

E o pior, é que todos os seus netos, desejavam ver-se livre dela, nem que fosse pelas suas férias, mas o que é certo é que ela ficava sempre em casa, dizendo que ali é que se sentia contente, rodeada das suas coisinhas.

Mas quando chegaram os 80 anos, chegámos à conclusão de que ela teria mesmo de vir viver connosco e, como havia um quartinho disponível, lá a conseguimos trazer, embora notando que ela mais desejava que fossemos nós a ir para a sua casa, em vez de ela para a nossa...

Claro que isso era impossível, porque ela vivia numa casa muito antiga e sem comodidade alguma, mas foi nela que nasceram todos os seus netos e a sua única filha.

A velhinha, aquela Rosa Agrieira, tinha muita piada e era muito esperta, muito atenta a tudo o que se passava à sua volta e sempre pronta a ajudar de quem dela se aproximasse, mas os netos estavam todos espalhados pelo país e dois em Inglaterra, pelo que a única disponível, teria de ser a minha esposa, até porque o gosto pelas férias, já se tinha atenuado, com o afastamento dos nossos filhos, e assim não fazia grande sacrifício em ficar constantemente com ela.

Passado pouco tempo de ela estar na nossa companhia, começou a queixar-se muito dumas dores nas costas que não abrandavam em qualquer posição, nem de dia, nem de noite...

Segundo o seu médico assistente, Dr. António Ventura, ela estava cheia de bicos de papagaio, mas como tinha uns bons pulmões e coração, teria que inevitavelmente, sofrer daquelas dores, até porque já sabia desde há muito, que o seu estômago não aguentava qualquer analgésico.

Quando ele ia a sair de nossa casa, ainda lhe perguntei: "Então vamos abandonar a velhinha ao seu sofrimento ?", ao que ele respondeu: «E ela vai ter muito que sofrer, porque com aqueles pulmões e coração, está para durar..:".

E fiquei a cismar, pois já tinha lido umas coisas sobre Ondas de Radio ou Diatermia, e era coisa que eu poderia fazer, por ter a profissão da electrónica e ser radioamador com indicativo CT1DT.

Mesmo com esta ideia na cabeça, falando pela radio com outro médico amigo, Dr. Fragoso de Almeida, também radioamador, como eu, mas com indicativo CT1PK, , ele me disse que dada a sua idade tão avançada, provavelmente não daria nada, mas se não fizessem bem, mal não faria...

Foi quanto bastou para eu entrar de imediato na construção dum gerador de ondas de radio e ao aplicar as suas placas nas costas da velhinha, logo verifiquei que ela tinha lá um grande alto, mesmo no meio das costas e muito doloroso. Assim, coloquei uma placa acima e a outra abaixo, e ajustei a potência até ela dizer que já estava morninho...e assim ficou durante 15 minutos.

Mas, ao fim deste tempo da aplicação da Ondas Curtas, ela que tinha sido levada ao colo, por mim e minha esposa, toda encolhida e gemendo com as dores, não desejou ajuda e, realmente se levantou da cama onde tinha feito o tratamento e muito direita, só dizia: «Isto é milagre... é milagre, só pode ser milagre...», e lá foi pelo seu pé, para o seu quartinho, tendo-se assentado num confortável "maple" e pegado numa costura que já estava parada há muito tempo, pondo um lenço branco sobre o seu cabelo já muito branco, por causa do Sol.


No dia seguinte, fui convidá-la para fazer uma segunda sessão, mas ela até respondeu que já nem necessitava... mas lá foi pelo seu pé e se colocou de lado, para fazer a nova aplicação.

Para nosso espanto, aquele inchaço havia desaparecido por completo e como ela era magrinha, até se podiam contar agora, as vértebras.

Mas eu sempre estranhei que ela só se alimentasse de sopas de café com leite, fazendo sopas com pão integral e não queria mais nada...a não ser um fruto qualquer...

A minha esposa é que me contou que aquilo já era a sua alimentação, desde há mais de 30 anos, desde que havia descoberto que aquela dieta experimental, não lhe provocava as tremendas dores de cabeça de que vinha a sofrer desde há muitos anos...

Mas certo dia, a velhinha aparece com vómitos e mais vómitos e só se viam coisas negras a sair pela boca, pelo que a minha esposa logo descobriu a malandrice... ela tinha ido ao alguidar das azeitonas, e como já não tinha dentes, sem que ninguém desse por nada, ela as ia papando, e cuspia para dentro do alguidar, os caroços, para que ninguém soubesse! Aquilo é que ela era uma velha marota...

Isto descobriu minha esposa, porque, ao chegar ao fim das azeitonas, estavam lá uma data de caroços...

Não havia ela de estar aos vómitos...mas sempre negando que se tivesse atirado a elas...

Mas já para cima dos 90 anos, a velhinha começou a dizer que via procissões a andar pelos cortinados do seu quarto e os meninos e o Sr. Prior... e outras vezes, eram touradas e cavalos... e danças...

Como seria aquilo possível, pois ela interrompia a conversa normal, que estava a ter connosco, para se referir ao que estava a ver e depois ria-se e dizia: «Isto deve ser da minha cabeça, porque realmente, não pode ser...»

Segundo conversa com os médicos, ela estava a ficar senil e isso era normal, quando algumas pessoas chegavam àquela idade.

Um dia, ia eu a passar em frente à sua porta, ela me chamou, pedindo-me para chamar a mãe daquela menina que estava ali mesmo, a chorar pela mãe...

Oh pá, aquilo era demais, pois não havia qualquer criança nem ali nem na casa, e pedi-lhe para me indicar onde é que essa menina estava, pelo que ela logo me disse; «aqui, aqui, », mas quando eu passei a mão pelo sitio, para lhe mostrar que não havia ali criança alguma, ela me disse: «ela fugiu para trás daquele móvel...»

Mas o que diabo eu poderia fazer ? Aquilo é que estava mesmo ali, uma açorda !!!

Mesmo assim, e porque o móvel não era muito pesado, ainda o afastei da parede para ela ver que não estava lá ninguém, mas a velhinha se mostrou um tanto amargurada, por eu não a ter visto e até me pareceu chocada, tal era a certeza de que a havia visto e até feito festas à criança... prometendo-lhe que iria procurar a sua mãe.

Aquilo só poderia ser um curto-circuito cerebral, entre a sua memória actual e a antiga, em certos períodos de tempo. Eu já havia ouvido falar daquilo, mas estar na presença da pessoa, é que nunca !

Se fosse hoje, talvez ainda experimentasse as mesmas Ondas Curtas...

Noutra altura, ela me chamou para me mostrar, muito envergonhada, puxando um niquinho a sua enorme saia, como tinha inchado um joelho e isso lhe dificultava imenso o andar.

Mas porque diabo ela não me teria dito isso há mais tempo? Realmente, aquele joelho tinha o dobro do tamanho do outro !

De imediato, lhe apliquei as Ondas Curtas e para meu novo espanto, no dia seguinte, os dois joelhos já estavam com o mesmo tamanho e ela já podia andar.

Pois passou a haver outro problema, pois sem dizer nada à neta, muito sorrateiramente, saía de casa e ia dar uma volta pela vizinhança, conversar com as velhas da sua idade, até que a minha esposa dava pela sua falta e lá andava à sua procura. Aquilo é que ela era uma velha matreira !!!

Um dia, e preocupado não fosse ela dar algum tombo e partir-se toda... ainda lhe falei no uso duma bengala, mas ela logo se insurgiu, dizendo; « Bengala eu ? Para quê? Para me chamarem de velha ?»
Aí respondi: «Mas oh Rosa, quando é que se convence de que já está velhinha ?»

»Pois é, Sr. Portugal...» que era a forma por que sempre me tratava: «Pois é...tem razão, eu sou mesmo uma velha tonta...", mas nunca a usou, preferindo andar aos tombos !

Certo dia, por eu ter comprado uma máquina de costura eléctrica, a convidei a experimentá-la, e ela assim se assentou à sua frente, e vai de pô-la a funcionar, carregando no pedal... mas aquilo arrancou a toda a velocidade, o que a pôs a rir às gargalhadas... Mas lá se habituou e passado algum tempo, já se entendia com ela, fazendo bainhas de cortinados e panos para limpar o pó, o que a distraía imenso.

Esta velhinha veio a falecer aos 95 anos, mas sempre muito lúcida, a ponto de nos ter pedido para chamarmos um Escrivão do Registo Civil e, para nosso espanto, ela deixou bem claro, perante testemunhas vizinhas, que deixaria a sua "terça" à minha esposa... por ter sido a única neta que lhe havia dado o carinho de que ela tanto necessitava, e durante os 8 anos que viveu connosco.


Este seu propósito, acabou por resultar em que todos os seus irmãos, lhe deixassem de falar...

Como minha esposa sabia que eu não podia estar ao pé de mortos, e ela já havia falecido uma hora antes de eu chegar a casa para almoçar, nada me disse, mantendo somente a porta do seu quarto fechada.

E aguentou-se sem chorar, durante todo o almoço, só se vislumbrando uma certa tristeza...

Quando a despiram pela última vez, ela mostrava bem um enorme volume na barriga, como se tivesse lá dentro um enorme fruto.

Ou seja, aquelas tremendas dores de cabeça que ela havia tido 30 anos antes, já seriam devido àquele tumor que estacionou, com a dieta das sopas de café com leite.

Vai uma pessoa entender estas coisas !!!!

domingo, 24 de agosto de 2008

E DESTA, QUASE MORRI...

Aqui há uns tempos, fui encontrar no meu quintal, que não é mais do que um corredor cimentado de 2 metros de largo e uns 10 de comprimento, com muros com mais de 2 metros de altura, uma gata siamesa que para lá tinha saltado, ainda nem sei como... para ir ter 5 lindos gatinhos, mas ao tentar fazer-lhes festas, eles protestaram, mostrando os seus aguçados dentes...e soprando...

Isto é que está aqui um imbróglio, porque eu teria de os alimentar, quando a sua mãe já não os pudesse alimentar de leite ou eles tivessem idade para saltar bem alto.
Para eu dizer com franqueza, eu nunca entendi de gatos, nem muito menos de bravios...mas estava-me a fazer confusão o ter de lhes dar de comer todos os dias e, sei lá o quê....
Como não encontrei ninguém interessado neles, e até uns me diziam que os matasse, mas isso é que eu nunca faria... matar, só formigas, moscas, baratas e mosquitos...

Por outro lado, se os deixava entrar em casa, bem que os poderia andar a correr com uma vassoura, por baixo de todos os móveis, o que para os meus 81 anos, já não é nada fácil...
Ainda por cima, andei uns dias à procura de mau cheiro que tinha em casa e só depois de me deitar ao comprido no chão, junto duma cama de casal disponível, é que verifiquei que a malvada gata, lá tinha deixado aquele "presente" tão mal-cheiroso e havia que o retirar rapidamente.

Com a ajuda duma pá de lixo, e voltando a deitar-me totalmente no chão e até por baixo da cama, é que lá consegui chegar, mas só depois de lavar com água perfumada, é que o mau cheiro acabou.

Mas a certa altura, tive mesmo que ir ao quintal para fazer umas medidas duma antena e não queria deixar a porta metálica, de alumínio, e de esquinas muito vivas, aberta, pois era certo e sabido que a gata entraria...

Assim, deixei só uma nesga aberta, para poder meter um cotovelo, ao entrar, mas logo por azar, quando ia a entrar, tropecei no degrau e, como trazia as duas mãos ocupadas, lá vou eu disparado à esquina viva da porta, fazendo um grande golpe onde a testa acaba e começa o cabelo, que começou, de imediato a jorrar uma data de sangue pela cara abaixo.
Apavorado, vi logo que aquele golpe de 4 centímetros estava furioso de hemorragia e havia que travá-la, o mais depressa possível, pois a jorrar sangue daquela maneira, eu nem podia ir buscar ajuda a lado algum até porque era Domingo e até os vizinhos haviam saído.
Estava mesmo sozinho !
Mas o pior é que aquilo era sangue demais para estancar e conforme é meu costume, na casa de banho, tenho sempre tudo o que é necessário, como tinturas, gaze, algodão, pensos, água oxigenada e até tesoura.
Mas eu estava a sentir-me desmaiar e já sabia que se isso me acontecesse, estaria mesmo perdido, pois não tinha ninguém por perto para me ajudar, mas lá ganhei coragem e pensei com toda a força, que não me podia deixar abandonar àquela hemorragia, pelo que segurei uma compressa sobre a ferida e tentei acalmar-me, o que ainda levou algum tempo, mas acalmei.
Assim, e vendo que havia muito cabelo sobre a ferida, agarrei a tesoura e vai de cortar todos aqueles cabelos empapados de sangue e que estavam a deixar escorrer aquela tinta tão vermelha, pelos olhos, nariz e boca, escorrendo para o lavatório.

Com uma compressa de gaze lá fui lavando com água da torneira, tudo aquilo, e tentando não deixar nem um cabelo sobre a ferida e como queria colocar tintura, necessitava das duas mãos disponíveis, mas isso me obrigaria a ter de largar o penso.
Como sempre tenho à mão, uma tintura em SPRAY, a Collu Hextril, que uso há anos, para todas as feridas, ou irritação de pele, agarrei nela e esguichei para cima da ferida, enquanto a hemorragia foi parando, até que estancou e até o couro cabeludo secou. Até parecia magia !
Estava salva a situação !
Com outra gaze lavei toda aquela zona e como só tinha à mão uns pensos adesivos pequenos, pois foi mesmo com eles que tapei a ferida e assim ficou durante quatro dias.
No quinto dia, com muito cuidado, fui levantando os adesivos que já se mostravam a descolar, e para minha alegria, a ferida estava de óptimo aspecto.
Agora iria ficar mais uns dias ao ar, antes de poder tomar um banho e assim aconteceu.
E não levou pontos nem agrafes... nem mudanças de pensos, e estava feliz, mas a perda de sangue é que me deixou mesmo abalado, pelo que só depois de umas semanas, é que comecei a poder fazer qualquer coisa de normal, embora muito cansado.

Isto de chegar a esta idade, tem destes problemas, porque uma pessoa já não anda... mas vai arrastando os pés, que teimam em tropeçar em tudo... nem que seja um tapete, ou até um pé, no outro !!
É bonito chegar a esta idade, mas há que deixar SEMPRE, uma mão disponível...

sábado, 9 de agosto de 2008

ESTATELADO NO CHÃO E TODO NÚ.....

Aqui há pouco tempo, um amigo me enviou um e-mail com uma fotografia de um velhinho muito simpático e sorridente, e com este delicioso comentário:

"A foto mostra Henry Allinghom, nascido em Inglaterra em 1896, quando ainda reinava a Rainha Vitória.
É veterano da 1ª guerra mundial, participou das batalhas de Ypres e Jutlândia e fez parte do primeiro esquadrão da RAF, a força aérea britânica, da qual é o último descendente ainda vivo.
Allinham diz que viveu 112 anos, à base de cigarros, Whisky e mulheres fogosas... "

Tendo eu estado a viver à custa de milagres da Providência, e tendo chegado aos 81 anos, naturalmente que fiquei a sorrir e quase a ter de dar uma boa gargalhada , ao ver aquela cara toda enrugada, mas feliz, a referir o seu modo de vida, como aquela referência, certamente jocosa de "mulheres fogosas": Pois ele devia ter passado a vida a pensar no bom que teria sido, poder voltar aos seus 20 ou 25 anos, quando lindamente fardado de aviador, teria à sua beira, talvez, as mais lindas mulheres com que um homem pode sonhar.
Mas, aos 112 anos... ná, amigo Henry, dessa não me convences !!!!

Mas uma coisa era certa, ele tinha vivido uma batelada de anos e ainda estava feliz.

Aqui há pouco tempo, quando escrevi neste blog "Que bom chegar a velhinho" , em Maio deste ano 2008, eu também me estava e estou, graças a Deus, a sentir um velhinho cheio de sorte e feliz !

Aqui há uma data de anos, uns dez, apercebi-me de que me estavam a aparecer nas fezes, uns laivos de sangue e como já sabia que por ali, ninguém pode ter sangue, fiquei bastante alarmado e fui logo fazer um clister opaco, em que o relatório, era claro: dois pólipos, um no cólon ascendente e outro igual, no descendente, mas infelizmente já do tamanho de morangos. Ou seja, eles teriam de ser retirados de imediato, pois segundo as minhas leituras, 90% destes pólipos, resultam em cancro.
Assim, e embora já perto dos 70 anos, me resolvi operar, embora contestado por algumas pessoas de família, de que eu já era velho demais para aguentar tal operação... mas mesmo assim, fui mesmo fazê-la.
Como não era considerada operação de urgência, ainda tive de esperar um ano, até que num telefonema do hospital, o médico que me iria operar, me perguntou como é que eu estava e se nem constipado estava e que lá aparecesse lavado por dentro e por fora... às 9 da manhã e em jejum.

Assim fiz e lá apareci, mas uns tempos antes, havia estado numa consulta com uma médica do hospital em que lhe contei que já vivia por milagre, desde os meus 18 anos, pois todos os médicos que me haviam tratado, já haviam morrido há muito e que, provavelmente eu não aguentaria nem com a anestesia...
Mas ela, mais ou menos sorridente, me foi dizendo que não havia razão para eu estar assim tão preocupado, porque me via muito bem disposto e brincalhão e aquilo nem seria complicado de operar.

O telefonema do operador, lá me "acordou" daquela preocupação e fui à procura da Sala de Operações, do Hospital de Vila Franca de Xira, onde me obrigaram a beber dois litros dum líquido mal-gostoso, e que, segundo o enfermeiro, era para me limpar por dentro, completamente...
Bem que eu entendi, pois abrir os intestinos que não estivessem bem limpos, é que podia ser uma carga de trabalhos para o operador e para mim...
Assim, levei aquilo à risca e realmente chegou à altura de estar completamente limpo por dentro e por fora: o líquido que saía, tinha a mesma cor do que entrava.

Mas como eu fumo um macinho de cigarros por dia, levei com o meu pijama e mais alguma roupa, e sabonete, um macinho de cigarros e isqueiro, embora soubesse que seria expressamente proibido fumar lá dentro...

Quando estava a beber aquele malvado liquido, apareceu à minha frente, um rapaz novo, talvez com uns 25 anos, junto com a sua esposa, uma mulher positivamente linda, e ele a gemer de uma operação ao apêndice que tinha feito.
Aí perguntei-lhe: Você fuma ? Ao que ele me respondeu que sim, mas que nem um cigarro tinha para matar o vício...e ainda lhe custava mais o não poder fumar, do que as dores que tinha na barriga.
Então, fui à minha cama e saquei do meu macinho de cigarros, bem escondido, e disse-lhe: você vai ao WC, e fume um cigarrinho, porque fica logo melhor.
O rapaz todo sorridente e com a ajuda da sua linda esposa, muito devagar, com a sua mão direita na virilha direita, lá foi até ao WC e depois de uns 15 minutos, voltou com uma cara de muito contente e agradecido.

Mas no dia seguinte, logo pela manhã, entra um enfermeiro pelo meu quarto e enfia-me uma agulha num braço e mandou-me subir para uma maca que foi empurrada por um corredor, até à Sala de Operações, onde entrei e vi vários médicos e uma anestesista, que me voltou a picar e começou a fazer-me perguntas simples, como era o meu nome e que idade tinha... mas num repente... pimba, adormeci. Apaguei-me...
Estava completamente anestesiado e noutro mundo !
Só acordei umas horas depois, noutra sala, mas ainda me lembro de ter pensado, por que diabo eu me teria deixado operar e até estava raivoso... embora nada me doesse, mas não me lembrava de nada da operação. Por que diabo eu estava tão raivoso ? Seria que eu havia sentido dores e não sabia?
Estava na Sala dos pós operados e passado pouco tempo, lá me empurraram a maca pelo corredor fora, indo-me colocar numa sala com outros para operar e que me começaram a fazer perguntas...
Quando olhei à minha volta, tinha tubos de plástico metidos por tudo quando eram buraquinhos do meu corpo, à excepção dos ouvidos... e tinha um grande "remendo" na barriga, que ia de cima do umbigo uns 10 centímetros, a outros 10 centímetros abaixo dele! "Mas que grande naifada eles me tinham dado..."
Nuns suportes altos, estavam pendurados uns frascos de soro e outro de alimentação e outro de anestesia e eu ali estava tranquilo, mas sem saber o que me tinham feito.

No dia seguinte, entram 3 enfermeiros, em que um trazia uma bacia de água quente, enquanto os outros dois me desnudaram todo, e vai de lavar-me, como se eu estivesse todo sujo ! Irra, que raio de ideia a deles, porque tiveram de me rebolar para lavar por cima e por baixo, e isso é que me fazia doer um bom bocado...
E lá estava eu todo entubado, já cheio de vontade de fumar um cigarrinho, mas tive mesmo de aguentar.
O pior, é que no dia seguinte, veio um outro enfermeiro e verificou que já podia retirar alguns tubos, os que me entravam pelo nariz, outro da pilinha, outros das garrafas e me disse: "Agora vai tomar banho sozinho"...
Olha que gaita, pensei eu... Lavar-me novamente e porquê, se eu nem estava nada sujo nem suado... aquilo já era mania, mas com um pouco de ajuda, saí da cama, agarrei a toalha, o sabonete e outro pijama, além da máquina de barbear, e lá vou eu, corredor fora, até à casa de banho, sala grande, mas toda encharcada, para me lavar e sozinho !
Mas que raio de ideia a deles, pois o rasgão que me haviam feito na barriga, embora tivesse tapado por um grande adesivo impermeável, aquilo doía, mas lá me consegui pôr todo nu e vou tentar abrir o chuveiro.
Mas, mal dou uns passos no chão escorregadio de água e sabão dos outros que já lá tinham estado a tomar banho, escorreguei os dois pés, e com enormes dores, me vejo estatelado no chão e todo nu !
Aquilo é que estava ali um imbróglio, porque as dores eram muitas e não havia forma de me conseguir por em pé, mas lá fui de gatas, até à sanita, onde coloquei as mãos e me consegui erguer.
Seria que teria rebentado com os pontos ?
Então pensei: mas o que é que eu estou aqui a fazer, se ainda ontem me deram banho? Ná! Enxuguei-me, lavei a cara, depois de me ter barbeado, e muito calado, vesti o pijama lavado e voltei sorrateiramente para a minha cama, como se tivesse tomado um valente banho !
Mas às tantas, veio um enfermeiro e enfiou-me novamente os tubos nas veias e ajustou o pinga.pinga e foi-se embora.
Passada uma ou mais horas, ele voltou e vendo que tinha pingado pouco, abriu mais um pouco a torneirinha e o pinga-pinga aumentou de ritmo... e eu a ver... e foi-se embora.
Mas passadas mais umas horas, ele voltou com outro frasco na mão, e disse; então este frasco já devia estar vazio !!!
E vai de abrir mais um pouco a torneirinha, mas passada uma meia hora, eu vi que o ritmo dos pingos já havia diminuído e sem que ninguém visse, fui à torneira e experimentei a rodá-la, pondo aquilo a correr mais.
Dai a bocado, o enfermeiro voltou e ficou todo contente de já poder substituir a garrafa de plástico...
Mal sabia ele que eu é que tinha estado a regular o pinga-pinga, quase de meia em meia hora...
Mas no outro dia, lá me vieram com aquela mania de eu ir tomar banho novamente, eu que estava tão limpinho... Já era mania !
Assim, sorrateiramente, agarrei o macinho de cigarros e isqueiro, toalha e pijama e lá fui para a casa de banho, mas foi para fumar dois cigarrinhos seguidos tal era a saudade... e depois voltei para a cama de barba feita e todo bem cheiroso do sabonete que também tinha levado.
Como entretanto o líquido que evacuava, já estava só rosado, mandaram-me comer uma comida leve e no dia seguinte, eu já era outro. Parecia que estava tudo reparado.

Ao fim de 5 dias daquela marmelada, mandaram-me embora, mesmo perto da hora das visitas e foi no carro da minha filha, que voltei para casa, e lá tive de voltar uma semana depois, para tirar o adesivo e até vi que a enfermeira estava toda contente, porque não se havia infectado nenhum ponto, e com um alicate especial, tirou os agrafes todos.
Pudera, o meu maior cuidado, tinha sido não molhar o adesivo, não fosse molhar o rasgão da barriga e arranjar alguma infecção...que era o que eu tinha mais medo...

Mas eu sabia que no mês seguinte, teria de lá voltar para ouvir o médico sobre a biopsia que tinham feito aos pólipos e eu ali estava à sua frente, a vê-lo com uma cara muito carrancuda, a ler um extenso relatório.
O médico até era simpático e se chamava Bruto da Costa, mas eu estava num estado de nervos terrível, pois estava mesmo à espera que fosse algo canceroso e tivesse de ir fazer quimioterapia...
Mas quando ele chegou ao fim, fez um sorriso, avançou-me com a sua mão direita e me deu os parabéns, porque eram só tumores benignos e podia ir descansado para casa.
Aí, é que não consegui aguentar mais e desatei num pranto de lágrimas incontroláveis, mas feliz, mesmo muito feliz.
E nunca mais lá voltei, e até hoje e a pensar: Será que eu vou viver até aos 112 anos, como aquele piloto inglês Henry Allingham!
Isso é que era bom e, demais !

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

E A MINHA CADEIRA PEGOU FOGO...

Era Inverno, mas eu havia estado tranquilamente assentado na véspera, na minha cadeira favorita, de costas para a janela que dá para a rua, e dele me vinha a luz, mais do que a suficiente, para poder ler e pensar tranquilamente, ou ouvir deliciado as minhas músicas favoritas e irradiadas pelas minhas brutais colunas de HI-FI, dado ser um apaixonado pelo som de alta qualidade.

Como toda a gente, eu também gostava muito daquele meu cantinho, que tem sido desde há muitos anos, mais de 30, o meu lugar preferido e de tão tranquilo e calmo, que imensas vezes, me deixo adormecer por algum tempo.

Dele posso comandar toda a aparelhagem de HI-FI, Gira-discos, Videotape, DVD e CD's, além dum receptor de TV de médias dimensões, só com o estender dum braço.

O mais engraçado, é que quase toda esta aparelhagem, me foi oferecida para deitar ao lixo e talvez poder aproveitar algumas peças. Mas como Deus me deu um pouco de habilidade e paciência, mais ou menos , sempre fui encontrando maneira de as repor em funcionamento ... nem que para tal, tivesse de usar semanas e semanas de trabalho... muita persistência e estudo.

Quase todas estas reparações, deram origem à escrita de artigos técnicos que ia publicando na única revista técnica portuguesa, de rádio, que se publica em Portugal, em Viseu, e que se chama QSP, onde descrevi como havia executado as reparações, com a ideia de entusiasmar outras pessoas a optarem por reparar elas mesmas, em vez de simplesmente, deitar ao lixo.

Pelos comentários e correio que alguns dos seus 8000 leitores, me iam fazendo, a pouco e pouco fui ficando talvez demasiadamente conhecido... mas só nessa revista, já publiquei quase 1000 paginas, e desde há muitos anos.


Verdade seja dita que as minhas conversas via rádio, com tanta gente desconhecida, também ajudaram a que as minhas comunicações deixassem transbordar um pouco desta alegria de ajudar os outros e assim ganhei centenas ou milhares de amigos.
Hoje, com 81 anos, sinto a felicidade profunda de ter podido ajudar imensa gente com ideias e opiniões.

Mas para estar melhor de temperatura, eu havia colocado um cobertor eléctrico sobre as pernas, desses pequenos, que só colocava sobre as pernas, transversalmente, na cama, até que havendo chegado a hora de jantar, sacudi-o de cima de mim, e desliguei a corrente eléctrica geral do meu "quarto dos brinquedos", onde tenho quase tudo o que é ligado à rede de energia, como PC, equipamento de comunicações rádio em muitas bandas, imensa aparelhagem de análise de electrónica, Printers, Piano electrónico, além da biblioteca repleta de artigos técnicos de todo o estilo, até mesmo médicos, montanhas de discos LP, cassetes e CD's, máquinas fotográficas, cinema, video, etc...

Esta operação exige um disjuntor geral e, para ter a certeza de que não fica nenhum aparelho ligado, desligando-o, posso abandonar a sala em descanso.

No dia seguinte, e por norma, enquanto me estou a "alindar", ligo esse disjuntor e o computador, deixando-o a carregar tudo o que é normal, incluindo o correio electrónico.

Assim, mal me sinto suficientemente "alindado", venho ver o que o PC deixou entrar e logo começo a faina do dia, vendo os mails e respondendo a todos os que têm de ser respondidos, ou gozando com muito do correio entrado, algum mesmo de me fazer rir, de tão jocoso que é, e outros me deliciam a ver imagens de todo o Mundo, daqueles "pps", com imagens de sonho, ou pequenos filmes do YOUTUBE. Ou seja, deixo entrar no meu quarto, O MUNDO !

Mas naquele dia "malvado", enquanto me estava a "alindar", notei cheiro a fumo e logo me dirigi à cozinha, sítio mais provável de me ter esquecido de alguma coisa ligada, até porque a minha governante estava lá, mas não; o cheiro vinha do meu quarto dos brinquedos, para onde corri, mas embora estivesse a luz acesa, não via nada!!!

Estava completamente às escuras com espesso fumo negro e, de imediato, ainda sem saber o que estaria a originar aquela fumarada, logo desliguei o disjuntor, mas nesse preciso instante, o cobertor eléctrico entrou a arder em poderosas chamas! Explodiu!

Pior, agora já não era só o fumo, mas o calor das chamas era insuportável !

Ainda corri ao WC à procura dum balde de água, mas já não conseguia apagar o fogo que se agarrou aos cortinados da janela e já as chamas iam no tecto, com a minha cadeira a arder e até as madeiras da janela, além do chão e duma secretária cheia de material electrónico, que está mesmo ao lado!

Ainda berrei à porta de entrada, para me chamarem os bombeiros, mas eu já sabia que se eles aparecesse, e até só estavam a uns 500 ou 600 metros de distância, toda a minha valiosa aparelhagem, iria para a sucata com a água que eles me iriam lançar sobre ela... provavelmente...

Felizmente que a minha governante, a D. Paula Pirico, mulher intrépida e muito desenrascada nas lides do campo e com as fogueiras que tinha de fazer todos os anos, para se ver livre do pasto seco, logo se lembrou que o melhor seria abrir a janela e atirar com o cadeirão a arder por ela fora, e se alguém lá estivesse a passar, que se afastasse!

Uma coisa era certa, não havia mais tempo a perder e a falta de ar era enorme, além do calor abrasador que inundava o quarto todo ! Felizmente que era um rés-do-hão !

Mas como chegar à janela, se aquilo era um mar de chamas ?

Com enorme coragem, a D. Paula enrolou uma toalha no seu braço direito, estendeu-o por entre as chamas e conseguiu abri-la de par em par, e com a minha ajuda, lá conseguimos nós os dois, agarrar os dois pés da frente do cadeirão, nuns centímetros que ainda não estavam a arder e num repente, atirámos com o "maple" para a rua, onde já estava toda a vizinhança a ver o espectáculo... do outro lado da rua.

Daí a momentos, surgem os bombeiros que abafaram o incêndio do cadeirão, aquela coisa estranha e incrível, pois provavelmente ninguém entendia porque estaria um cadeirão a arder daquela forma...

Eu já não podia mais respirar e estava quase a desfalecer, mas a minha intrépida governante, arrancou os restos dos cortinados que ainda estavam a arder, enquanto eu ia buscar mais água e assim, lá conseguimos acabar com aquele incêndio, mas a sala estava toda negra de fumo, paredes e todos os aparelhos existentes !

Que tristeza de quarto, mas felizmente a estante dos livros não tinha sido afectada e com imensa paciência, peça a peça, lá se foi limpando cada uma e inclusive o soalho de madeira, até tive de arrancar muitos tacos que já estavam a arder e eram só carvão.

Nos dias seguintes, havia imenso que fazer, como lavar as paredes enegrecidas, até voltar a ter o meu cantinho dos brinquedos, em condições de se poder lá estar, se levou muito tempo, pois havia que deixar secar tudo e inclusive pintar o quarto de creme, que era a sua cor normal, e o tecto de branco, trabalho que a minha governante teimou em fazer por suas mãos.

Para a D. Paula, aquilo tinha sido só mais um incêndio, mas para mim, não !


Por que diabo o cobertor eléctrico se teria incendiado ?

Na verdade, bêbado de sono, na véspera, eu não me lembrava de o ter desligado, quando o tirei de cima de mim e ele tinha ficado mais ou menos dobrado, quando eu liguei o disjuntor no dia seguinte.

Ou seja, naquelas dobras do cobertor, a temperatura tinha subido drasticamente em poucos minutos, logo se seguindo o disparar do incêndio.

Aquilo nunca mais me deveria acontecer e até escrevi depois, um artigo para uma revista técnica de radio, para que nunca se deixasse um cobertor eléctrico dobrado e ligado.

E fiquei a pensar nos imensos incêndios que estes cobertores eléctricos têm proporcionado, por este motivo.

São coisas muito bem feitas, mas têm de estar sempre alisados e nunca os tratar como simples e vulgares cobertores. Eles não permitem dobras.