Nota de abridura: Este conto de embalar, passado de geração em geração, chegou até nós, contado de viva voz pelas avós, nas horas de fazer oós.
Era uma vez um Reino Encantado que ficava lá p’rás bandas do rabo deste velho mundo, à borda d’água prantado, e tão no extremo que atrás dele só havia o sol posto.
Era um pachola e recatado Reino que vivia a santa paz do Criador.
No princípio foi verbo virulento anticéptico!
Virulento porque era rápido a virar com violência, os modos de pensar, de agir e até as jalecas; anticéptico porque impelia a acreditar que tinha que ser-se anti qualquer coisa e era-se anti tudo e anti todos.
E naquele tão anti...go e bonançoso Reino Encantado havia desde os anti faz-se isto, passando pelos anti faz-se aquilo e a metro, até aos anti faz-se seja o que for e nada se fazia no Reino em que toda a gente reinava.
Neste Reino muito virado ao progresso, progredia-se e trabalhava-se hoje menos que ontem mas mais que amanhã para que crescesse o PIE – Produto Interno Estúpido.
Era um Reino mais que banal!
Era um Reino bananal de que dizia-se ser o Reinadio Reino dos Bananas.
De burocracia reduzida, já só tinha a funcionar menos de metade dos locais de atendimento, o despachar papeis nos locais públicos era a tiro.
Tirava-se carta e bilhete, aquela para conduzir, este para se saber quem se é, e com tiros mais certeiros tirava-se certidões desde a da parição até à do passamento, mas esta nunca era para quem a tirava.
Nas hortas do Reino, muito viradas para as verduras, eram uma beleza de hortaliça as alfaces pequenas e os grandes nabos, a que se dedicavam quase em exclusivo e, como não estavam viradas para as “encarnaduras”, os tomates eram muito mirrados e escassos e, quando apareciam, eram em seguida esmagados para fazer gaspacho.
Era, por excelência, um excelso Reino ecológico, não só pelo muito que ecoava, mas também por ter aeroplanos de pedais e machimbombos de vela.
Velava-se tempos infinitos à espera que aparecesse um e com lugares vagos e havia que pedalar muito para se conseguir ir pelos ares do meridião para o setentrião.
No Reino Encantado não havia falanges!
Os entronizáveis eram societários das associações recreativas, difusas por todo o Reino, as quais instituíam recreios de proposição reitoral para a entronização em causa.
Nos reitorais recreios para inculcar o reitor do Reino ou os reitores subalternos, os circunstantes recreavam-se com “reitóricas” tão brilhantes que até faiscavam e chamuscavam.
Gozava o Reino de uma sólida economia!
Tinha montes de bancos e caixas!
Os primeiros para os reformados tomarem sol, uma coisa rica que podiam tomar à vontade, as segundas para os associados das recreativas encaixarem valiosas funções.
Por ser um bom investimento toda a gente investia no tesouro do Reino, e às vezes era cada investida que fazia pensar na falta de uma IVA – Informação do Valor Alcançado.
A real indústria produzia e consumia, acima de tudo, subsídios de consideráveis qualidade e variedade e que eram grandemente apreciados e difundidos.
Os mais procurados eram os que metiam água, porque cobriam os danos causados pelas secas nas subsidiadas semeações que não tinham sido feitas por causa das cheias.
Também tinham enorme aceitação os que eram aplicados na subsistência das associações recreativas, tanto de bombordo como de estibordo, pois o Reino tinha fortes tradições marítimas e não queria borrascas nos recreios.
A nobreza do Reino era muito modesta!
Os mais insignes e iluminados varões não passavam de barões, mas havia muitos!
Havia-os de tudo e para tudo. Desde os barões dos bares até aos barões das águas, nítidas e turvas, passando pelos barões da luz e da sombra, todos tinham Dom e a mesma divisa no brasão: - “Andar na Brasa Para Reinar”.
Foi o Dom dos barões da saúde que erradicou totalmente todas as doenças no Reino, quando descobriu que o melhor remédio para os doentes era não lhes dar remédios.
E a saúde do Reino era excelente o que dá um final feliz ao conto.
Se alguém adormeceu antes de acabar, é que o conto é mesmo de embalar.
Nota de fechadura: Atente o utente deste conto de embalar que se achar que se dá ares a algum outro de despertar é pura imaginação do lente.
Prosador do Soltavento
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