quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

DE MÉDICO E DE LOUCO, TODOS TEMOS UM POUCO...


Quando em 1976 a empresa onde eu trabalhava, começou a chamar os funcionários para inspecção médica no seu Centro de Saúde da Gloria, em Marinhais, fomos encontrar um exame clínico que nos estava a atormentar a todos, e de que maneira...

Esse exame, além das medidas de tensão arterial e força muscular manual, era completado pelo assoprar num balão cilindrico, cromado, e devia fazer subir uma vareta pelo topo, graduada em litros de ar expelido pelos nossos pulmões. Aquilo se chama "Espirómetro"...

O exame de força muscular manual, era feito com uma espécie de alicate com uma mola fortíssima e que, ao apertar, marcava a força exercida. Ainda me recordo que nesta medida, eu era um espectáculo ! Quase partia o alicate, embora ficasse com a mão a doer... !

Mas, em cada ano que se passava, mesmo sem darmos fé de falta de "capacidade vital", o que é certo é que a vareta cada vez indicava menos ar ou, era o mesmo que se dizer, que estávamos a ficar secos por dentro...

Aquilo estava a amargurar toda a malta, e de que maneira !

A resposta do enfermeiro era sempre a mesma: «Os senhores estão a envelhecer com enfisemas pulmonares a agravarem-se e têm de ter mais cuidado com o ambiente onde vivem, em especial com o tabaco».

Aquilo não me estava a agradar mesmo nada, porque estava a perder cerca de meio litro por ano e daí a poucos anos, estaria sem "fole" nenhum; estaria morto.... Aquele aparelho não podia estar a funcionar correctamente e o pior, é que os dados estavam a ser inseridos nas nossas fichas clínicas como autênticas "certidões de óbito" prematuras...

Assim, resolvi pensar no que estaria dentro daquele tambor cromado e que só poderia ser um fole, parecido com os das máquinas fotográficas antigas e que, perante o assopro, se distenderia para cima, empurrando a referida vareta que teria de subir livremente, o que não estava a acontecer e era necessária muita pressão, para que ela subisse. Assim, a indicação dos litros de ar, estariam completamente erradas...

« Não », pensei eu, tinha de haver uma outra forma e de confiança, para aquela medida... e vai daí, pensei que um garrafão de plástico, de 5 litros, com um tubo metido até ao fundo e uma saída cá em cima, à laia de cabo de guarda chuva, para não levarmos com a água na cara, ao assoprar no gargalo, devia ser muito mais fiável e assim, executei a "maquineta".

Assim, comprei meio metro de tubo de plástico e duas uniões em cotovelo, de 20 milimetros de diâmetro externo, fiz um furo ao lado do gargalo do garrafão de plástico, como se pode ver pela foto, e colei com pástico derretido, o expelidor da água.

Depois, para calibrar, foi-se metendo litro a litro, água da torneira, e marcando no exterior os litros entrados, até se chegar ao gargalo. Depois é só assoprar de uma só vez, o mais que se puder, e ver quanta água saíu.

Obviamente, que os litros tiveram de ser marcados ao contrário.

No caso da foto, o ar expelido por um jovem de boa saúde, chegou aos 4 litros, mas ainda podia ser melhor.

Claro que a primeira pessoa a soprar, fui eu, tendo constatando que ainda possuia uma bela capacidade pulmonar de 2,5 litros, para um "jovem" de 70 anos, naquela altura, e que teve problemas pulmonares graves, há mais de 60 anos....enquanto que no Centro de Saúde, só me dava meio litro....

Claro que muitos outros funcionários que tinham passado pelo Posto Médico da Glória, se prontificaram a experimentar a máquina e todos ficaram radiantes com os resultados ! Afinal não estavam a morrer !!!

Como o próprio enfermeiro, de nome Ramalho, também estava muito amargurado com os seus exames, logo foi contactado pelo telefone e, passados poucos minutos, lá estava ele a atirar cá para fora com 5 litros de ar...o que muita alegria lhe deu, porque no tambor lá do consultório, só conseguia 2,5 litros... o que ele não conseguia entender, até porque tinha uns 50 anos, não fumava nem frequentava lugares poluídos e até fazia algum desporto. Por aquele andar, ele só teria para viver, mais poucos anos...

Assim, não havia dúvida de que o tal aparelho estava mesmo avariado e tinha estado a "enfiar o barrete" a todos os desgraçados que nele tinham assoprado...

Os próprios médicos, Dr.Carvalho, Bacalhau e Duarte Silva, não conseguiam encontrar explicação para aquele facto e limitavam-se a aconselhar todos os pacientes, a não fumar, fugir do ar poluido, fazer exercício físico, fugir de estar em sítios poeirentos, fugir de respirar os fumos das soldaduras electricas, etc.etc., mas mesmo com todas estas recomendações, toda a malta estava "a morrer" rapidamente...

Na realidade, ele logo mandou reparar o aparelho, o qual levou um fole novo e logo passou a indicar valores mais aproximados da verdade.

É que estando lá dentro um fole de tela, e a maior parte do tempo, todo amachucado no fundo do depósito, com o decorrer dos anos, a tela se tinha endurecido e cada vez era necessária maior pressão para o fazer dilatar, abrir e esticar para cima.

Assim, passei a não ter qualquer confiança naquele aparelho de consultório, pois até nem estava nada interessado em morrer a curto prazo e sem sentir aquela falta de ar indicada pelo "malvado" aparelho...

Escrito por Engenhocando em 2007/05/02 às 10:37:42

2 comentários:

Anónimo disse...

Foi com muito interesse que li todas as suas "histórias" aqui escritas como mensalmente o leio na revista "QSP",pois gosto muito da electrónica em geral, sou uma especie de auto-didacta e ando sempre com projectos disto e daquilo é então na sabedoria de homens como o senhor que vou aprendendo sempre algo como também os gosto de ouvir e como entusiasta que sou da rádio (faço colecção)tenho sempre o prazer de os escutar como ler.
Um abraço!!

Escrito por: José Lopes em 2007/05/15 - 03:05:10

Mário Portugal Leça Faria disse...

José Lopes,

Muito grato pelo seu comentário a ENGENHOCANDO e que, só hoje consegui responder.
Bem haja, pelas suas simpáticas palavras. (Comentar)


Escrito por: Mario Portugal Faria em 2007/06/01 - 12:10:07